Ter inteligência ou ser inteligente?
O leitor considera-se uma pessoa inteligente ou procura sê-lo? E como é que os outros o consideram e tratam? Gostaria de desenvolver esta capacidade, em si e nos outros, ou é daqueles que a consideram um dado adquirido, em que não há nada que se possa fazer?
A inteligência é um dos fatores que mais discrimina na nossa sociedade, com um problema adicional: enquanto a riqueza patrimonial pode ser taxada e o rendimento redistribuído pelos mais desfavorecidos, no caso da inteligência isso não é possível, pelo menos de forma direta.
Nada incomoda mais um politico do que a inteligência do seu adversário, e a inteligência dos que em seu nome fala. A maior pobreza é, sem dúvida, a pobreza de espirito, normalmente associada a um grau menor de inteligência.
A inteligência tende a ser ignorada e desprezada, pelo menos oficialmente. Não é de bom tom falar disso, mesmo quando se tratam de pessoas dotadas. O entendimento geral é que pode gerar sentimentos de mágoa e inferioridade, arrogância e superioridade, inveja e frustração, no próprio ou em terceiros, e, é algo pelo qual pouco ou nada se pode fazer. Pelo menos é difícil. Deixa-se para as anedotas de chacota.
Sabe como é que os franceses distinguem os belgas num aeroporto?
Normalmente eles estão a atirar milho aos aviões.
É um exemplo, semelhante a outros que poderá facilmente encontrar em várias culturas.
A inteligência é um dos fatores que mais contribui para o sucesso, a riqueza e a felicidade, de um individuo, de uma família, de uma empresa ou de um país. É facilmente reconhecida, respeitada e apreciada pela generalidade das pessoas, mas poucas a conseguem explicar e compreender na sua substância.
Por vezes, parece ser semelhante ao amor ou a um talento, como por exemplo o talento para a música. A mesma pessoa pode experimentar níveis diferentes de intensidade ao longo do dia e da própria vida.
A inteligência alimenta-se de informação que transforma em saber e conhecimento, dando-lhe utilidade prática, constituindo sabedoria, que se traduz em soluções para problemas específicos.
A curiosidade e o interesse por tudo o que nos rodeia, a tolerância às opiniões e ideias dos outros, a abertura de espírito, o gosto pelo diferente e novo, o entusiasmo pelos desafios, uma visão positiva e confiante da vida, e até uma certa alegria de viver, são algumas das características comportamentais que normalmente potenciam a inteligência.
Como quem não sabe, é como quem não vê, e o pior cego é o que não quer ver, saber mais sobre o fenómeno da inteligência é o primeiro passo para melhor a utilizar e desenvolver.
Embora se apoie numa base genética e de personalidade, como ponto de partida e como outros talentos, a inteligência desenvolve-se a partir de estímulos, estados emocionais e atuações específicos.
Assim a inteligência é algo a que podemos recorrer mais ou menos vezes e que é passível de desenvolvimento. A questão central é mais, ser ou não ser inteligente (praticar procedimentos que conduzam à utilização e desenvolvimento da inteligência enquanto talento), e querer ou não querer ser inteligente (vontade própria de a utilizar e desenvolver).
Em termos práticos podemos identificar 3 tipos de inteligência diferentes e suscetíveis de desenvolvimento, interligados entre si:
- Inteligência cognitiva, dedutiva e abstrata – que muita gente confunde com inteligência no seu sentido absoluto. Muito focada na aprendizagem na escola ao promover determinados tipos de raciocínios de natureza cartesiana, na base do pensamento cientifico. Apoia-nos no planeamento, na conceptualização, na análise de situações, na dedução lógica, no rigor, Está associada à memória assente nas relações lógicas, na estrutura, na organização.
- inteligência emocional ou relacional - ligada à gestão das emoções e da interação humana. Permite-nos saber e sentir o que os outros estão a sentir, e, interferir nas suas emoções. Ajuda-nos a viver e a obter os nossos objetivos e satisfação de necessidades na selva humana. Foi a complexidade da vivência em sociedade que estimulou o desenvolvimento da inteligência humana. E esta continua a exigir um desenvolvimento ainda maior, sobretudo ao nível das emoções pessoais e dos relacionamentos. Aprende-se normalmente, mal, na família e no grupo de amigos mais próximo, e, através da experiência do dia a dia. Está associada à memória das emoções mais fortes, que nos fazem sentir felizes ou infelizes.
- inteligência instintiva ou prática – centrada no momento imediato e no futuro imediato que se segue. Muito suportada nos instintos de sobrevivência individual e da espécie (reprodução). Expressa-se de forma operacional, através de perceções e de habilidades concretas, como a manual, identificação de cheiros, sabores, sons, imagens, capacidade de visualizar situações futuras e passadas, etc, O bom senso, o sentido do prático, do espaço e do tempo, a vontade de fazer, a determinação para a tomada de decisões, são muito apoiados neste tipo de inteligência. Está associada à memória dos prazeres e do agradável, e, das dores e desconfortos, com focagem particular nos acontecimentos que nos podem por em causa, em termos de vida mas também enquanto indivíduos independentes, com vontade própria. É a inteligência que mais utilizamos no nosso dia a dia e que mais interfere com a nossa atividade hormonal e celular. E por esta razão, a que mais determina, no bom e mau sentidos, a nossa vida, direcionando e condicionando fortemente os outros dois tipos de inteligência mencionados.
Naturalmente que o ideal será desenvolver e equilibrar entre si, cada um destes tipos de inteligência, que se completam e potenciam. Na prática, quase sempre, um deles tem predominância sobre os outros, tornando o exercício da inteligência manco.
Nas organizações, de acordo com a minha experiência, quase sempre o esforço de desenvolvimento se centra na inteligência emocional, sobretudo quando se trata da prestação de serviços, e na inteligência instintiva, mais em particular quando se trata do desenvolvimento de competências comerciais e de liderança.
Cada vez mais, existe uma urgência de desenvolvimento da chamada inteligência coletiva ou de grupo, que ao nível de uma organização se traduz numa maior eficiência e fluidez no trabalho em equipa e numa posição mais sólida no mercado e na sociedade.
A inteligência de grupo faz-se com o somatório das inteligências individuais multiplicado por vários fatores de estimulação, de complementaridade e de inovação, normalmente com consequências extraordinárias ao nível dos resultados.
Muita informação existe hoje sobre o desenvolvimento dos vários tipos de inteligência. Espero que tenha estimulado o leitor, neste breve artigo, a procurar alguma dessa informação, e, sobretudo, a iniciar um processo de desenvolvimento. Como diz o ditado, mais inteligência nunca fez mal a ninguém.
Votos da prática de uma boa inteligência
Carlos Carreira
Gestor de empresas, coacher, formador, investigador
Autor dos livros “Para Lá dos Teus Limites” e "Explora os Teus Limites"
ccarreira@exodusconsultores.com